E a nossa identidade o estereótipo não levou!


Para assinalar o dia 24 de outubro – Dia Municipal para a Igualdade, a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género lançou o desafio ao Município de Santa Maria da Feira promover a divulgação da campanha da União Europeia #EndGenderStereotypes que sensibiliza para a questão: “Estereótipos de Género são a principal causa das desigualdades”.

Os estereótipos correspondem a ideias generalizadas, construídas socialmente e que são disseminadas de forma a simplificar e agrupar crenças sobre as pessoas. Quando os estereótipos são relacionados com o género significa que essa mesma generalização agrupa pessoas e atribui-lhes determinadas características de acordo com o ser homem e ser mulher. Para além disso, é comum serem atribuídas “padrões”  de funcionamento para um determinado grupo. Um padrão de funcionamento culturalmente construído e expectável para os homens e para mulheres.  E estes papéis criam uma expectativa de que as pessoas se têm de comportar e sentir de determinada forma se forem homens e de outra forma se forem mulheres. Tal leva a que as pessoas que estão associadas a determinando grupo se sintam pressionadas para corresponder às expectativas e papéis que lhes são atribuídos

Estes estereótipos ou ideias pré-concebidas sobre o que é ser homem e o que é ser mulher, estão tão enraizados que se assumem como naturais e raramente são questionados. Desde que se nasce que parece haver uma orientação automática para determinados comportamentos. Ou seja, se se nasce com um órgão genital feminino, são automaticamente atribuídos papéis sociais relacionados com o ser mulher, e se for um órgão masculino, são atribuídos papéis sociais relacionados com aquilo que é ser homem.

Contudo, para definir o ser humano é preciso considerar uma vasta gama de características físicas: altura, cor de olhos, cor de pele, cor do cabelo…; Com distintas características psicológicas: empatia, espirituosidade, coragem, timidez, curiosidade, pessimismo…; Com distintas características biológicas: níveis hormonais de androgénio e testosterona…; 

Há, assim, uma associação muito redutora quando se relaciona o órgão genital masculino e dizemos que a sua identidade é de homem e que por isso devem agir, pensar e sentir de determinada forma de acordo com os papéis de género culturalmente definidos e que ditam quais as características do que é ser homem. Da mesma forma, para um grupo de pessoas com órgão genital feminino em que a sua identidade é de mulher e por isso devem agir, pensar e sentir de acordo com aquilo que é, culturalmente, ser-se mulher. Como se a identidade do ser humano pudesse somente ser definida num  num sistema binário. 

Enquanto seres individuais, as pessoas possuem um leque de outras características, não homogéneas, isto é, que não são iguais em todas as pessoas do sexo feminino e do sexo masculino. Diferentes pessoas têm diferentes características. Então, porque é que se assume uma sobreposição entre os sexos ao invés de uma avaliação individual enquanto pessoa “EU”: Especial e Única?

Aos homens associamos culturalmente, e a título de exemplo, um conjunto de características relacionadas com a virilidade, o risco, serem provedores e confiantes. As expectativas atribuídas relativamente à mulher são por exemplo de fragilidade, submissão, serem cuidadoras. De acordo com o boletim estatístico de 2022 da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, em relação à educação, tendencialmente as mulheres têm maior incidência sobre os cursos de educação, saúde e proteção social e ciências sociais, jornalismo e informação. Sendo a sua representação em menor percentagem nos cursos de tecnologias de informação e comunicação, engenharia, indústrias transformadoras e construção. Não poderá estar isto relacionado com a forma como somos socializados e não estarão as nossas escolhas condicionadas aos estereótipos de género? Não estaremos automaticamente socializados para investir mais em determinadas tarefas que estão associadas a determinado género, tendo isto impacto ao nível da escolha profissional, ao nível da nossa intimidade, e de tantos outros contextos?

A identidade é bem mais complexa, composta pelo sexo biológico, mas não só, também por outras dimensões como a expressão de género, a orientação sexual e a identidade de género.

A identidade de género diz respeito à identificação individual de cada pessoa em relação ao género. Fazendo recurso a fontes fidedignas como suporte de informação, nomeadamente a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, as pessoas podem identificar-se ou autorreconhecer-se enquanto homem, mulher, enquanto ambos, enquanto pessoa trans e/ou não binária.

É urgente desconstruir, não normalizar estes papéis e não generalizar. Compreender que a experiência humana é mais vasta do que as ideias pré-concebidas que temos sobre o que é ser homem e ser mulher.

É urgente dar liberdade para as pessoas serem capazes, em segurança, de serem quem são. Sem o risco do preconceito. Sem o risco da discriminação.

É urgente promover uma sociedade que não vive na dicotomia, que não divide aquilo que é do homem e aquilo que é da mulher. 

Os estereótipos parecem ser uma forma de simplificar a visão sobre o mundo, contudo apresentam uma visão redutora ao minimizarem a pessoa a uma única ideia sem contemplar tantas outras características que a distingue. Serão os estereótipos uma forma de controlo social? Mais prejuízos podem ser identificados em relação aos estereótipos, se uma pessoa não se identifica com determinado grupo pode ser alvo de preconceitos e críticas e a estereotipagem pode limitar a pessoa a vários níveis uma vez que estão presentes em todas as dimensões da vida. 

Criemos a possibilidade das pessoas traçarem livremente o seu percurso, possam ser livres de reconhecer qual o seu género, de acordo com as suas características, qualidades e preferências, explorando a diversidade de escolha que o mundo tem para oferecer. 

Criemos esta possibilidade independentemente apenas do órgão genital externo que inatamente nos foi atribuído e dos papéis de género que inevitavelmente nos foram atribuídos por estarem associados a uma única característica: o sexo.

A limitação social que é imposta nas nossas escolhas consoante os estereótipos de género afeta profundamente a liberdade, a concretização de aspirações e a descoberta do nosso potencial. A normalização dos estereótipos acentua as desigualdades. As desigualdades levam-nos ao preconceito que pode arrastar consigo a discriminação. Essa discriminação que está tantas vezes na origem da violência.

O género é um sistema que atribui significado ao sexo, mas o nosso género não é um reflexo do nosso sexo. O género é uma das prisões dentro das quais vivemos.”(Daphna Joel e Luba Vikhanski, cérebro e género). 

Nenhuma pessoa é completamente idêntica a outra. Que o respeito pela diferença e a inclusão  sejam a base das relações humanas.